Assim também atua a Justiça divina, que perdoa realmente uma criatura que pecou, se esta reconhece o erro e se esforça diligentemente em repará-lo. Depois de perdoada, é impossível afirmar que tal criatura tenha pecado, pois seu erro foi de tal forma extinto na Criação que nenhuma marca permaneceu nela. Isto é realmente perdoar!
Bem ao contrário do que ocorre com o ser humano em relação ao seu próximo. Freqüentemente, com ares de magnanimidade, ele faz saber que o perdoa por uma pequena falta cometida, mas jamais deixará de exclamar: "Aquele é fulano, que me fez isso e aquilo outro; eu, porém, já o perdoei!..." Hipocrisia. Somente hipocrisia reside no falso perdão humano.
Na sua indolência e vacuidade, o ser humano aceita como verdadeiras coisas que não existem. Assim é também com relação à sua tola esperança num perdão divino adaptado à sua inércia espiritual. Ninguém consegue obter o perdão de seus pecados através do número de orações, de penitências, de jejuns ou de contribuições monetárias. Sem esforço próprio, esforço interior em melhorar, não se avança um milímetro sequer no desenvolvimento espiritual e, conseqüentemente, não se pode remir culpa alguma.
De nada adianta se o ser humano "pensa" que as coisas sejam diferentes, só porque sua religião assim ensinou. Sua ignorância a tal respeito é apenas uma culpa a mais, pois, conforme já dito anteriormente, ele nunca ficou sem auxílio para poder compreender corretamente as Leis das Criação.
A crença num Amor divino que tudo perdoa arbitrariamente, sem levar em conta a Justiça, contribuiu ainda mais para a queda do ser humano. Ele pôde assim entregar-se a toda sorte de vícios e paixões, pôde maltratar o seu próximo tanto quanto quis, pôde, enfim, fazer tudo quanto julgasse necessário para satisfazer suas cobiças e ambições terrenas, pois no final bastava um leve aceno em direção ao alto para torná-lo novamente um beato exemplar.
Não só nenhum de seus erros lhe foi perdoado dessa maneira, como também sobrecarregou-se com mais uma culpa enorme, ao acreditar nessa concepção pueril de benevolência arbitrária e injusta do Criador. Uma blasfêmia da mais baixa espécie. Julgar que o Criador possa deixar Sua Vontade tornar-se mercadoria barata de barganha...
Os poucos que vez ou outra se perguntam se isso estaria certo, afastam logo de si tais pensamentos exortadores, seja por temor de tocar em algo "sagrado", seja por atribuir esse tipo de questionamento a uma incumbência específica dos teólogos de sua religião. Se existe gente incumbida de estudar essas coisas e fornecer as devidas respostas, por que se incomodar? E se também tantas pessoas aceitam uma tal concepção, por que questioná-la?... Mas se tal concepção for uma coluna mestra de sua crença, se for um "dogma", então, como já dito, seria pecado até mesmo pensar que isso poderia não estar certo!
O raciocínio do ser humano hodierno encontra rapidamente todo tipo de argumentação para sufocar a já fraca e quase inexistente intuição do seu espírito, que ainda se manifesta às vezes, aqui e acolá, através de dúvidas exortadoras. O espírito vivo reconhece rapidamente o falso, e através da intuição procura fazer valer sua vontade. Todavia, como ele, o espírito, está muito enfraquecido pelo domínio do intelecto, numa situação insana que vem já de milênios, suas exortações não são páreo para as rebatidas do raciocínio, como vimos acima.
OBS: Por ser um artigo muito extenso, a última parte será postada amanhã!
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